domingo, 5 de dezembro de 2010

O Guerreiro Solitário, Henning Mankell

"Antes do amanhecer ele deu início à sua transformação.
Havia planejado tudo meticulosamente, de modo que nada pudesse sair errado. Levaria o dia inteiro, e não queria correr o risco de que o tempo não fosse suficiente. Pegou o primeiro pincel e o segurou à sua frente. No gravador de fita cassete que estava no chão podia ouvir a batida de tambores que havia gravado. Estudou seu rosto no espelho. Então desenhou as primeiras linhas pretas ao longo da testa.
"

Autor: Henning Mankell
Editora: Cia Das Letras
488 pag.

Tradução de George Schlesinger





Mesmo que a comparação fique em um ideário romântico de leitura, vejo a literatura policial fazendo jus ao seu estilo um tanto quanto marginalizado. Há um bom grupo de leitores do gênero, lançamentos mensais são uma prova disso. Porém, pouco se fala a respeito. Consagrando a idéia equivoca de que seu texto é mais ralo, sem tanta construção narrativa. Lê-se sim, mas não se produz crítica a respeito.

Parecendo tal idílio romântico de leitura que, como investigações, têm de ser feita as escuras, sem muito alarde. Uma bobagem que ressalta, pela segunda vez, certo preconceito que se fez com tal gênero.

Fato é que diversos países não só consomem assiduamente tal literatura como possuem seus mestres. Além do cânone primordial do crime, como Agatha Christie, Conan O´Doyle, George Simenon, autores contemporâneos que galgaram em seu país de origem um título pomposo por suas histórias de qualidade.

Evidente que leitores brasileiros podem achar risível a idéia de um escritor cânone do crime no país. Já que no Brasil há pouca produção de tal literatura. Há mais recursos do gênero destilados em obras, como em textos de Rubem Fonseca e Marçal Aquino, do que narrativas tradicionais envolvendo detetives e casos policiais. Dessa lavra, o Delegado Espinosa de Luiz Alfredo Garcia-Roza é um excelente, e talvez único, representante.

Consideradas tais afirmativas, Henning Mankell é um escritor sueco que ganhou o pomposo título de rei do crime pelo jornal The Economist. Seus livros somam, no Brasil, cinco títulos lançados. Seguindo o estilo tradicional da produção de autores do gênero: apresentar um personagem marcante - em sua obra o inspetor Kurt Wallander - que é ponto central da trama. Artifício que mantém uma seqüência lógica na construção da personagem, muitas vezes destroçada após um caso ruim, e aprofunda ainda mais a potencia de sua humanidade.

O último lançamento a despontar aqui foi O Guerreiro Solitário, lançado com quinze anos de atraso de seu original. Porém, em pesquisa efetuada no site oficial do autor, a publicação do livro ao menos prossegue a ordem cronológica oficial. Dando para o leitor a possibilidade de acompanhar, sem pulos, a evolução natural da personagem.

A trama situa o inspetor prester a sair de férias mas vendo-se obrigado a se encarregar de estranhos casos de suicídio e assassinato que, aparentemente, como regem a cartilha, não possuem conexão. Seguindo a linha de um bom policial, contrariando a namorada ansiosa pela viagem, abdica de suas férias para não perder o rumo das investigações.

A personagem central criada por Mankell possui nenhum atributo extra, sendo um policial típico. Sem arroubos de genialidade ou capacidade dedutiva brilhante.

O progresso da investigação, realizado ao lado de sua equipe, é feita de maneira minuciosa com qualquer pequeno detalhe que possa ser uma pista. Não importando quanto tempo leve para desvendar as dificuldades que apareçam em sua frente. Um exercício de suor, cansaço físico e mental.

A tangibilidade de suas personagens heróicas fomentam a crueza e realidade da narrativa. Refletindo detetives e policiais esforçados que podem estar presentes em qualquer delegacia. Representando um aspecto profundo de verossimilhança.

A edição da Companhia das Letras faz parte da boa, e bela, coleção policial da editora que, recentemente, repaginou seus lançamentos. Trocando as capas em branco e preto por imagens mais coloridas, mas ainda sem mudar o bom padrão das bordas em cores.

Ainda sem uma segunda tiragem, é notavel alguns erros de digitação que passaram desapercebidos pela equipe de revisão e que devem ser corrigidos em prensagens futuras. Porém, tal problema é um mero detalhe.

O único que talvez possa confundir alguns leitores seja referente a tradução da obra. Originalmente composta em sueco, a edição brasileira foi traduzida da versão inglesa, embora tal informação seja um pouco equivocada no verso da folha de frente.

Tal recurso é um processo delicado mas utilizado por algumas editoras que, por não terem especialistas em uma língua considerada mais difícil, encontram em uma versão uma tradução mais fácil de se verter. O que não pode ser considerado exatamente ruim, já que uma tradução de outra pode fluir melhor do que uma direta de uma língua que não possui bons tradutores no país. Resta ao leitores a esperança de que a tradução da tradução que foi lida seja o mais próximo que se pode chegar da obra original do autor.


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