terça-feira, 10 de julho de 2007

Cui Prodest?

Ontem dormi nas escadarias de minha casa ao fumar um cigarro com meus pensamentos. E quando vi, os pássaros me incomodavam com seus sons e a claridade machucava meus olhos, mesmo fechados. Ao mexer meu corpo, notei o quanto estava dolorido. Dormir apoiado à parede, no sereno de quase mais um inverno, não é inspirador.

Me levanto, tiro o pó de minhas roupas e volto lentamente para a casa. Sentindo gradativamente seu calor. Preciso de um banho, pensei. Mas mesmo após despertado, já estou cansado demais.

Abro as portas até a cozinha, deixo-as abertas. Tomo um copo d´água, depois outro e mais metade de um. Penso que, se a água não possui sabor nenhum, não deveríamos não sentir gosto algum? Sinto um gosto, só não consigo defini-lo.

Vou para meu quarto, acendo a luz, tiro o livro da cabeceira e abro na página marcada. Faço contas, mais ou menos há um mês o livro não sai do lugar. Não quero lê-lo mesmo querendo saber o final. Nos últimos meses esse é o quarto ou quinto que sofre esse problema.

Saio do quarto, as portas abertas trazem frio ao interior da casa. Tanto faz, penso. Pego uma folha de papel, caneta, escrevo uma frase: “Quem se beneficia?”. É estranho que apenas com essa frase eu já fora capaz de escrever.

É o que gostava de fazer. Escrever da forma que me satisfizesse, buscando algo singular, conquistando poucos leitores.

Grifo a frase que escrevi, um risco torto a lápis, “Quem se beneficia?”, penso sobre ela. Conto nos dedos da mão e somavam-se aproximadamente um ano e meio que não havia histórias que contei.

Se for uma crise, dura demais. Se quero, concluo, o que me impede? Escrevo a mesma frase na borda da página, “Quem se beneficia?”, penso. E rio, por achar que há um vilão que ganhasse lucros com minha vida doente, acordando nas escadarias da casa.

O vilão sou eu, sei disso. Mas, se sei, o que me impede de continuar? É medo de se manter igual. Levantei-me, fui à biblioteca, procurei o que já escrevi. Centenas de textos ruins, cartas de amor que nunca mandei, cartas de amor enviadas a destinatárias que não merecem nada, se não a infelicidade. Todo amor termina em cinismo, ri de mim mesmo nessa hora.

Preciso de um banho, porque não tomei quando acordei? O corpo coça, exala um cheiro que não me acostumei, mesmo com a idade.

Espalho os textos no chão, leio-os um a um. Não. Tudo é igual. Palavras repetidas infinitamente, verbos iguais, construções lexicais idênticas. Tudo que escrevi era uma segunda construção de mim. De minhas tristezas, de amores não possíveis pela minha esquizofrenia, ou pela loucura das meretrizes. Não. Eu sei até que ponto enlouqueci de verdade, e até o momento que fingi pelo romantismo.

Estou de pé vendo os papéis no chão. Penso em um gigante vendo o mundo de cima. Tudo está errado, e não consigo descobrir o porque. “Quem se beneficia?”, não. Era ridículo supor que havia vigias, homens de dedos gordos e poderes naturais.

Não. Coloco as mãos nas têmporas. Encontre a razão nisso tudo, pensei, repetindo a mesma frase, como a decorá-la. E aconteceu. Eu vi. A primeira vez que escrevi, as histórias que se seguiram desde então, amigos, amantes, pecados, dores que nunca somem e voltam, velhos bumerangues, minha loucura e o desejo de perder tudo para não ter nada. Estar vazio de si mesmo a ponto de não se reconhecer. Sim.

Sim. Consegui o que queria. Matei a figura de dentro de meus sonhos, não houve sobrevivente. Matei a mim mesmo.

Corro ao papel, escrevo meu nome por extenso embaixo da frase. Eu fui o beneficiário de meu crime. Investiguei sempre a mim e conclui no passado que a única forma de viver livre era cometendo um assassinato. Deixando tudo que se é para trás. Silêncio. Não havia motivo para matar a si mesmo, exceto por não gostar de quem se é.

Coço minha cabeça, a sujeira incomoda, não havia beneficiário. Não. Errei em meus próprios planos? Sabotei a mim mesmo ou homens estão me observando? Controle-se, não há nada de errado. Não escreva palavras que você conhece apenas pelo vício. Foque em um objeto, deixe fluir os pensamentos. Não. Eles são errados, a vida é. Quem se beneficia?

Pausa. Para dividir o silêncio com minhas dúvidas. Sei porque não escrevi mais. Não há mais eu. Livre de opiniões quando enforquei a mim, nessa sala. Eu lembro. Entre o natal passado e o último verão. Lembro do quanto agonizei. Esqueci de refazer-me. Cometi um crime sem dar a ninguém seu benefício.

...

Quatro horas mais tarde termino meus pensamentos. Garganta seca, me sinto doente, nada mais. Não há uma frase de efeito para finalizar as palavras. Assim, dou as costas e vou ao banho.

Araraquara, terça feira, 10 de Julho de 2007.

quarta-feira, 4 de julho de 2007

O Que Dr. House Diria?

Acho curioso como todos usam a abstração da vida para jogar todas as culpas para ela, sem deixar que você seja o culpado por seus próprios erros. Fazendo conspirações maiores, traçando rotas de que aqui não foi uma decisão sua, e sim do destino. Que as coisas não eram para ser, simplesmente não eram para ser. Aceitando uma condição puramente fictícia da realidade.


Quanto tempo você demora de manhã na frente do espelho escrevendo seu papel? Quanto tempo você planeja suas falas e as coloca na ponta da língua? Há tempos você não é você. É uma personagem, porque assim é a maneira que você gosta que os outros te vejam. Porque seu sonho é ser famoso e ser um vilão de uma novela global.


Você se devora em tristeza, mas quando pede as respostas, todas as pessoas que lhe trazem caminhos são colocados para fora do seu caminho. Ninguém gosta de ser acusado de falso, mentiroso, mesquinho.


Pois adivinhem, eu sei o ator que corre nessas veias porque dia e noite eu luto para ele não sair. Para ele não planejar quando entrará em cena, pois quero ainda ser eu mesmo. Todas as minhas palavras, até as mais doces, possuem pequenos espinhos, que se mastigados servem para causar dor. Mesmo a mim.


Eu fui vil, meu senhores. Eu já menti demais nessa vida para achar que tenho tempo de fazer conjecturas, eu uso as afirmações porque agora é o que me convém.


Adianta, afinal? Fazer-se de vítima de si mesmo, um drama eterno que eu sei que você atua, porque você sente prazer em ser miserável. E mesmo que você me peça respostas, seu ódio por mim será maior se eu te disser o que realmente penso. Mas se querem saber de mim, eu não escondo o quão ridiculo sou em toda minha existência, o quão babaca e o quão egoísta. Eu aprendi que as mentiras podem ser saborosas, mas nada é mais pungente que uma verdade. Que a maldita verdade em cartaz.


Você não nasceu para ter nada que realmente valesse, das rosas você só merece o espinho. Você não nasceu para ser amado, você nasceu para ser prostituido, um cigarro que se fuma pelo prazer rápido.


Você vai se fingir de valente, fingir-se de forte, porque dentro de sua histeria, ser fraco é um defeito. Não aquilo que te faz humano.


Seu mundo são as paredes da sua cegueira porque você quis deixa-lo vazio, porque se nem você mesmo pode se salvar, nem um cristo poderá intervir.


Enquanto isso do alto do castelo mais alto, na torre mais alta, as mulheres sonham com os principes que chegam a qualquer momento. E você ou é o cavaleiro que abre as portas da masmorra ou a donzela inexistente desse conto de horror.


Você é uma mentira, porque é assim que você quer. E assim tudo que passar por você, será transformado na mentira que você quer acreditar. Minhas mãos estão limpas dessa vez... Porque sei que nessa traição, eu não recebi nenhuma moeda de prata. Foi sua loucura que me chamou de Judas.


Preste atenção, e eu estou falando com você. Enquanto você continuar sendo um maldito boneco de si mesmo, sua vida continuará incompleta. Quando eu te vejo só posso observar um jogo, onde você mesmo tenta te dar o xeque mate.


Sábado, 30 de Junho de 2007.