É impossível não se identificar com a residente que busca encontrar sua identidade sem repetir os erros de sua mãe.
Os casos médicos, o ambiente hospitalar, tudo isso é apenas um cenário qualquer para que Shonda Rhimes explorasse as relações pessoais de forma profundamente intimista e honesta. A protagonista Meredith Grey é uma mulher confusa, com manias e preocupações quase adolescentes e não está sozinha. Depois de alguns capítulos você percebe que a regra que torna tão divertido e despretensioso esse seriado é colocar na boca de personagens bem sucedidos e adultos todos aqueles anseios e aquelas dúvidas que você teve bem antes dos seus vinte anos.
Tão confuso quanto Meredith é seu par romântico Derek Shepherd, um residente que acaba de chegar a Seattle e aparenta compartilhar os anseios de construir uma nova vida neste lugar. Bem humorado e otimista, faz contraste com a descontente Meredith. Porém, em alguns momentos, os papéis se invertem e fica claro a idéia de Shonda Rhimes ao criar tais personagens: Meredith descreve a si mesmo como cinza, em latente negação a uma filosofia dualista.
O foco também se volta aos outros internos, em especial George O´Malley, Izzie Stevens, Christina Yang e Alex Karev. O´Malley é um rapaz ingênuo e idealista que se apaixona por Meredith quase que instantaneamente ao conhecê-la. Ocupa o lugar que seria do "loser" nas séries declaradamente adolescentes. Em contrapartida, Karev faz o tipo "bad boy", com suas tiradas politicamente incorretas e inúmeras conquistas entre as mulheres do hospital. Izzie Stevens trabalhou como modelo para custear a faculdade e agora sofre com o preconceitos dos próprios colegas que a consideram menos capaz que os demais por ter que utilizar sua beleza em proveito próprio. Passional e impulsiva, demonstra uma enorme necessidade de aprovação.
Já Christina Yang, interpretada por Sandra Oh, é uma das personagens mais marcantes do seriado, muitas vezes até se destacando mais do que a protagonista. O romance com Preston Burke, cardio cirurgião residente, também se destaca ao longo da temporada. Enquanto Christina demonstra extrema dificuldade em expressar afeto, Burke tem as mais expressivas falas e gestos nesse sentido, o que o faz um grande sucesso com o público feminino.
Nessa primeira temporada, somos confrontados com os traumas da protagonista e suas razões para a clara dificuldade em criar laços. Conhecemos também a história de Ellis Grey, mãe de Meredith, que em uma outra época viveu uma história bem parecida com a de sua filha. Enquanto se identifica com a própria mãe, ela tenta traçar um caminho diferente para si e é impossível não relacionar esse conflito de gerações com a história pessoal de cada telespectador. Você pode até torcer o nariz e dizer que há séries médicas com textos melhores ou com personagens mais provocadores ou mesmo uma premissa mais adulta. O que não se pode negar, é que Grey's Anatomy, com sua tendência ao drama e seu texto leve, diverte e emociona.
Mariana Guarilha, além de escrever neste espaço, mantém dois blogs: o Blog da Má Jornalista, com críticas sobre filmes e séries e As Notas do Prisioneiro com seus textos narrativos.
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