sábado, 10 de julho de 2010

O Presidente Negro, Monteiro Lobato

"Achava-me um dia diante dos guichês do London Bank à espera de que o pagador gritasse a minha chapa, quando vi a cochilar num banco ao fundo certo corretor de negócios meu conhecido. Fui-me a ele, alegre da oportunidade de iludir o fastio da espera com uns dedos de prosa amiga.
- Esperando sua horinha, hein? - disse lhe com um tapa amigável no ombro, enquanto me sentava ao seu lado."



Autor: Monteiro Lobato
Editora: Globo
208 pág.






Relançado pela Editora Globo em uma bela coleção que contempla a obra adulta de Monteiro Lobato, O Presidente Negro, ganhou destaque em diversas notícias brasileiras na época da eleição do presidente Barack Obama, o primeiro presidente negro americano. Notícias traçavam uma relação tênue do fato histórico com a obra de ficção de Lobato, uma precursora capaz de prever tal eleição.

Escrito inicialmente em 1926, publicado com o nome de O Choque das Raças, o romance é o único do autor. E apóia na ficção cientifica para produzir sua narrativa futurista.

Fato é que a literatura de Monteira Lobato é bastante conhecida no Brasil, principalmente em sua faceta infantil no incrível Sítio do Pica Pau Amarelo. Sua importância no cânone brasileiro é alta, tanto que sua obra é abrangida na cartilha de estudo dos colégios. O que pode despertar preconceito em desavisados, supondo que sua narrativa seja chata, como a maioria das pessoas afirmam sobre os literatos estudados em sala de aula.

Lobato é um excelente prosador, com um estilo fluído, equilibrando-se entre a escrita e um estilo oral de narrar. Em sua história, conhecemos Ayrton um desastrado cobrador que, ao sofrer um acidente na estrada, é resgatado pelo professor Benson. Benson é um recluso cientista genial que, dentre as diversas invenções feitas, criou o porviscópio. Um dispositivo que permite ver o futuro, como quem vê a um filme.

Através do cientista e de sua filha, Jane, Ayrton conhece a disputa da Casa Branca no ano de 2228, onde há uma divisão entre o eleitorado branco, mulheres e os negros. Com a eleição do primeiro presidente negro, brancos e mulheres incapazes de aceitar tal condição, elaboram um plano para acabar de ver com o chamado problema negro.

O romance de Lobato funciona a maior parte do tempo. Quando somos apresentados as personagens centrais, e convidados para conhecer a tal cidade americana futurista, a narrativa flui com bastante elegância. Porém, quando a trama adentra diretamente a história dos negros em 2228, o enredo se torna arrastado e as soluções encontradas pelo escritor permanecem em uma tênue linha entre uma crítica ou um gigantesco preconceito.

É por não decidir-se entre a agressão definitiva ou a crítica que a parte final de seu romance perde o fôlego. As idéias racistas defendidas por Lobato são anteriores a esse romance, e o acompanharam desde o fim de sua vida.

Apesar do reticente desenlace final, é surpreendente a visão futurista de Lobato, que previu diversas invenções, utilizando-se de recursos criativos da literatura. Dando nova dimensão a o que seria o jornal, os jogos, e diversos objetos ainda não conhecido em sua época.

Até mesmo o pessimismo explícito no livro denota muito do sentimento visto pelo mundo no final do século XX. Porém, mesmo com uma narrativa elevada, é notório que seu desfecho não é finalizado com tanta competência.

Sendo lamentável que um escritor tão prolífico com Monteiro Lobato ganhe atenção últimamente apenas por essa singular obra, em vez de boa parte de sua obra adulta, sem mencionar a infantil, com maior qualidade literária.

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